quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

A Renúncia de Bento XVI e os caminhos da Igreja Católica

Tarcísio Brandão de Vilhena

 
São vários os comentários e especulações sobre a renúncia de Bento XVI e o novo Papa a ser eleito. Artigo de um teólogo intitulado: “A Igreja muda ou acaba”, é uma constatação de quem tem conhecimento e autoridade para dizê-lo. O artigo ainda diz que a atual estrutura do catolicismo constitui uma traição à igreja primitiva em que todos participavam com direitos iguais.

O que caracteriza a Igreja Católica é o poder. Desde o período feudal que a Igreja Católica se despontou como grande proprietária de terras, acúmulo de riquezas e concentração de enorme poder. O comando dessa estrutura, fortemente hierarquizada, ao estilo monárquico, concentra-se na mão do Bispo de Roma, o Papa. Com o passar do tempo, a Igreja Católica foi se vinculando cada vez mais às coisas temporais afastando-se de sua origem doutrinária e religiosa. Aqueles que se opunham à Igreja, pela concentração de poderes materiais e não se submetiam à autoridade do Papa, os chamados hereges, foram combatidos com extrema violência pela Igreja Católica e, após a organização do Tribunal do Santo Ofício, no século XII, o julgamento chamava-se Inquisição do Santo Ofício. Milhares de pessoas foram condenadas e executadas pelos tribunais da Inquisição, queimadas vivas.

No século XVI houve um enorme movimento dentro da comunidade Católica, contra a interferência da Igreja Católica no mundo material, e a criação de dogmas, regras e disciplinas, unicamente para manter o poder temporal e estendê-lo às pessoas. Desse movimento originou a Reforma Protestante, preconizada por um frade Agostiniano, Martinho Lutero e pelo pregador Calvino. Foi um protesto contra os abusos, as atrocidades e os desmando da Igreja Católica.

David Yallop em seu livro "Poder e Glória", narra: “a Igreja que João Paulo I herdou havia há muito se distanciado da Igreja de Cristo. O Vaticano controlava uma riqueza imensa. Erigida sobre privilégios especiais a riqueza do Vaticano era ocultada por um sistema de contabilidade antiquado e obscuro, ferozmente negada por seus porta-vozes. Em 1970 uma estimativa suíça, colocou o capital produtivo do Vaticano em 13 bilhões de dólares, excluindo-se os vastos bens globais de propriedade do Banco do Vaticano”.

Ainda segundo o livro, acordos secretos como o que foi celebrado em 1933 com Hitler no qual a Alemanha nazista repassava ao Vaticano mensalmente uma soma em dinheiro, o chamado “imposto da Igreja”, demonstra o ambiente político da cúpula da Igreja. Evidente que foi um acordo bilateral. Hitler, um ateu confesso, não seria capaz de tamanha generosidade.

João Paulo I cujo pontificado foi de apenas 33 dias, muitos sustentam que ele foi assassinado. É fato que ele tocou numa ferida perigosa: tentou por fim a cobiça da Igreja católica pelo poder temporal, e aos escândalos envolvendo o Banco do Vaticano e o Bispo Paul Marcinkus.

Ele protagonizou o maior escândalo financeiro da história do Vaticano: a quebra do Banco Ambrosiano de Milão, ocorrida em agosto de 1982, quando o banco foi declarado insolvente pelo governo italiano, após ter sido descoberto um “rombo” de cerca de US$ 1,5 bilhão. O Vaticano possuía 16% do capital do Ambrosiano.

As investigações da falência do banco trouxeram à tona entre outras operações nebulosas, pagamentos obscuros à loja maçônica P-2, aparentemente, desvio de fundos para uso particular e ligações com a Máfia. Foram acusados formalmente Marcinkus e dois administradores, Luigi Mennini e Pellegrino Strobel.

O Vaticano deu asilo ao arcebispo Marcinkus e seus dois colaboradores, para impedir sua prisão.

O Tribunal Supremo da Itália defendeu a impossibilidade de processar o arcebispo e os dois funcionários, em virtude do Pacto Lateranense, (Tratado de Latrão celebrado em 1929, que criou o Estado do Vaticano) que em seu artigo 11 prevê que “os entes centrais da Igreja Católica estão isentos de qualquer ingerência por parte do Estado italiano”.

O Vaticano gastou cerca de US$ 100 milhões, em 1983, para ressarcir os clientes do Ambrosiano, gesto que foi interpretado pela imprensa italiana como uma confissão de responsabilidade na quebra do banco. Mais tarde, o Vaticano criou mecanismos de controle para impedir casos como esse.

Dois meses antes da declaração de quebra do banco, em 16 de junho de 1982 o corpo do presidente do Ambrosiano, Roberto Calvi, que havia fugido para Inglaterra, tinha sido encontrado enforcado sob uma ponte de Londres, no que, aparentemente, foi um suicídio. Entretanto, em 1998, o corpo foi exumado para perícia e, em 2002, “uma equipe de médicos forenses encabeçados pelo professor alemão Bernd Brinckman disse que Calvi foi assassinado em um terreno baldio perto da ponte, onde foi pendurado para simular um suicídio”.

Em 1984, Marcinkus foi nomeado como um possível cúmplice no suposto assassinato do Papa João Paulo I pelo jornalista investigativo David Yallop em seu livro Em Nome de Deus. Yallop fez acusações a respeito de um número de suspeitos associados às relações de Marcinkus com negócios escusos e envolvimento com membros da máfia e o  Banco do Vaticano, afirmando ainda que Marcinkus pode enfrentar exposição penal, ele deve ser removido de sua posição no banco.

De fato, Marcinkus, foi demitido e enviado para a Arquidiocese de Chicago em 1990 antes de se retirar para o Arizona, onde viveu como um pároco assistente até a sua morte. Assim, aos 84 anos Paul Marcinkus foi para seu túmulo com seus segredos intactos. Provavelmente, nunca serão revelados.

O Papa ao renunciar abre caminho para uma reforma radical na Igreja católica. É sintomático quando ele diz: “Quando já ninguém me escuta, Deus ainda me ouve”. Com a sua renúncia caem aqueles que tornaram o Vaticano ingovernável: a voracidade da Cúria Romana. A renúncia do papa sinaliza um futuro nada promissor para uma estrutura fortemente construída, mas que vem se deteriorando ao longo do tempo, ensejando a sua decomposição por ela mesmo, em decorrência de uma rede de intrigas, conspirações e disputas pelo poder.

O Sacro Colégio de Cardeais quando reunido para escolher o novo Papa, tanto o Colégio Cardinalício como o novo Papa, terão pela frente vários desafios e muito que decidir. O momento é propício para estabelecer os novos rumos da Igreja: manter esta Igreja centralizada, controlada pela Cúria Romana, corrompida, adulterada e ostensivamente apegada às coisas temporais; ou promover o retorno às origens doutrinárias e religiosas: a Igreja de Cristo.

O celibato sacerdotal é outra questão que prioriza decisão firme, sem protelação. A comunidade católica e a sociedade em geral, não toleram mais meias medidas protagonizadas pelos acordos milionários para acobertar padres pedófilos ou ouras perversões sexuais, como o homossexualismo. É sabido que todos esses desvios e perversões decorrem da proibição imposta ao exercício do sacerdócio pelo celibato.

A mensagem de Bento XVI, direta e sem concessões, tem repercutido com força surpreendente. Não seria este o momento de reflexão? Nada justifica no mundo atual, a existência dessa estrutura, centralizada, fortemente hierarquizada e corrompida pela disputa do poder. Essa nefasta hierarquia em nada favorece o exercício da fé cristã e ainda causa indignação aos católicos pelos desmandos que se sucedem.

O Jornal Italiano, La República na edição de 21/02, denunciou que Bento XVI antes de abandonar o trono de São Pedro, deixando-o vacante até o fim do conclave, o Papa Bento XVI pretende se reunir com os 116 cardeais que elegerão seu sucessor para expor as conclusões do inquérito sobre o escândalo Vatileaks. O documento de 300 páginas - dividido em dois capítulos e escrito pelos cardeais Julian Herranz, Jozef Tomko e Salvatore De Giorgi - traria revelações bombásticas sobre a cúria romana, que incluiriam uma rede de agenciamento de encontros homossexuais, além da existência de grupos de pressão especializados em montar e desmontar carreiras dentro da Santa Sé e em desviar recursos multimilionários do Banco do Vaticano para usufruto próprio. 

O Arcebispo emérito de Aveiro, Portugal, Dom Antonio Marcelino que já presidiu à Conferência Episcopal Portuguesa, não tem dúvidas: "apesar de ter conseguido algumas reformas significativas, o papa sentiu-se impotente ante os conflitos, manobras e até traições, que se foram levantando a seus olhos, a ponto de tolherem o seu caminho". Ainda denuncia um centralismo controlador da Cúria Romana, que até condiciona o trabalho dos bispos nos diversos países; As conferências episcopais nunca foram queridas nem amadas pelos poderosos da Cúria, afirma o prelado.

Hoje, o que existe, são duas Igrejas: a fundada Jesus Cristo, e uma outra controlada pela Cúria Romana, corrompida, adulterada e ostensivamente apegada às coisas temporais.
O novo Papa deve retomar o papel de líder espiritual e renunciar o de chefe de Estado. O ambiente político contamina a Igreja.

Bento XVI desnuda a inconsistência das esperanças materialistas e faz uma crítica serena, mas profunda, dos caminhos da Igreja. 

Ainda Cardeal Raitzinger, falando durante uma série de meditações na Via Sacra de sexta-feira santa dizia: "quanta sujeira há na igreja, e mesmo entre aqueles que, no sacerdócio, deveriam pertencer inteiramente a Cristo”. “Muita, Santo Padre, muita mesmo! Deus ajude a Igreja Católica Apostólica Romana”.

 

domingo, 24 de fevereiro de 2013

OS REPUBLICANOS HISTÓRICOS CAMPANHENSES



Tarcísio Brandão de Vilhena

Na História do Brasil, dá-se o nome de republicanas históricos às personagens que tinham aderido à causa republicana, desde antes da proclamação da República. Entre estes, incluem-se os signatários do Manifesto Republicano de 1870, os abolicionistas que também faziam campanha pela república e os demais partidários e membros dos Clubes Republicanos, nas diversas províncias do Império antes do golpe de 15 de novembro de 1889, que proclamou a República.

Em Minas, não houve campanha expressiva, antes do manifesto de 1870, o que pode ser justificado pelo estado de decadência urbana ocorrida na Província desde a devassa da Inconfidência Mineira, cuja repressão visou também inibir as ideias republicanas, obrigando os mineiros a se refugiarem no silêncio. A rebelião liberal de 1842, embora liderada por um republicano convicto como Teófilo Otoni, não oportunizou a tendência republicana. O presidente rebelado da Província, Barão de Cocais, não permitiu a inserção de tal tendência no referido movimento. Mesmo que a punição aos revoltosos de 1842 tenha sido suave e condescendente, ela refletiu sobre Minas, de forma duradoura, os prejuízos morais da derrota. O partido liberal não conseguia se impor junto ao eleitorado, sempre vencido e encurralado pelos conservadores.

Ainda assim, antes do manifesto de 1870, alguns centros urbanos mineiros se despontaram com relativo progresso, a exemplo de Juiz de Fora, Diamantina e Campanha, e tiveram oportunidade de expressar ideias republicanas por oposição ao regime monárquico brasileiro.

De fato, em 1870, republicanos Campanhenses, liderados pelo Cel. Marthiniano dos Reis Brandão já defendiam os princípios e os ideais republicanos e federativos, não só em Campanha, mas em toda a região Sul Mineira. Naquele ano, ainda sob a liderança de Marthiniano, surge em Campanha o Clube Republicano, tendo a sua frente ilustres Campanhenses cultos, idealistas e independentes, dentre os quais se destacavam o médico Dr. Francisco Honório Ferreira Brandão, filho do Cel. Martiniano, o jornalista Manoel de Oliveira Andrade, o cidadão Domingos Honório Lopes de Araújo, o Cel. Saturnino de Oliveira, o Dr. Bráulio Lion, o Cel. Marcos Coelho Neto, o Dr. João Bráulio Moinhos de Vilhena Jr., o Prof. Jonas Olinto, o Dr. José Braz Cezarino, o parlamentar Alexandre Stóckler Pinto de Menezes, o Dr. Joaquim Leonel de Rezende Alvim, o Dr. Antonio Xavier Lisboa, Pe. Francisco de Paula de Araújo Lobato, Francisco Bressane de Azevedo, o Dr. Eustáquio Garção Stockler e outros.

As reuniões do Clube Republicano eram realizadas na residência do Cel. Marthinano. Esta residência ele a adquiriu na condição de genro do Comendador Paula Ferreira, o proprietário. Marthiniano era casado com uma de suas filhas, Anna Alexandrina Ferreira Brandão, e adquiriu as partes dos demais herdeiros. Esta magnifica edificação abrigou a Escola Normal, a Prefeitura e, por último, a Faculdades Integradas Paiva de Vilhena. Lamentavelmente, foi consumida por incêndio.

Em 1880, regressa à Campanha, graduado em Farmácia, o Sr. Zoroastro de Oliveira, filho de Saturnino de Oliveira, que passa integrar o Clube Republicano, sendo escolhido, por seus pares, para ocupar o cargo de secretário do Clube. Neste mesmo ano, o clube se reúne para escolher o nome de um dos integrantes para concorrer às eleições senatorias da Província, a serem realizadas em 27 de maio. A escolha recai no Dr. Francisco Honório Ferreira Brandão.

Transcorrida a eleição, foram eleitos: o médico Campanhense Dr. Francisco Honório Ferreira Brandão, pela região Sul Mineira; Dr. João Nogueira Penido, médico de Juiz de Fora; região da Mata Mineira, Dr. Joaquim Felício dos Santos, advogado em Diamantina, pela região Norte.

Um ano antes da proclamação da República, no dia 4 de junto de 1888, cria-se em Minas Gerais o Partido Republicano Mineiro - o PRM, com objetivo de representar as ideias republicanas aos oligárquicos da elite agrária do Estado de Minas Gerais. Neste mesmo ano, funda-se na Campanha, sede administrativa da região Sul Mineira, o diretório regional do Partido Republicano Mineiro, presidido pelo o médico Dr. Francisco Honório Ferreira Brandão.

A noticia da Proclamação da República pelo o Marechal Deodoro da Fonseca foi dada aos republicanos campanheses pelo parlamentar Dr. Stockler Pindo de Menezes, campanhense residente no Rio de Janeiro. No dia 17 de novembro de 1889, mais de cem eleitores republicanos reunidos na residência do Coronel Marthiniano, todos filiados ao PRM, sob a presidência do Dr. Francisco Honório Ferreira Brandão, decidiram lavrar uma Ata, na qual se declaravam solidários à proclamação da república e ao governo provisório, instalado após a proclamação. Excluindo Ouro Preto, capital da Província, Campanha foi a primeira cidade mineira a manifestar seu júbilo e seu decidido apoio à República Brasileira.

Desgostoso com o baixo nível e com a vileza dos adversários políticos contra a sua pessoa, Dr. Brandão deixa Campanha e muda-se para o Rio. Nunca mais voltou à cidade. Assume a presidência do partido o Cel. Saturnino de Oliveira. Após o seu falecimento, seu filho, Cel. Zoroastro de Oliveira, passa presidir o partido. Em 1927, Zoroastro abandona a vida pública e entrega a direção do partido para seu irmão, o médico Dr. Jefferson de Oliveira. Em 1929, Jefferson é eleito deputado federal. O vereador Dr. Serafim Maria Paiva de Vilhena passa ocupar a presidência da Câmara e, por consequência, torna-se o Agente Executivo do município e presidente do partido. Com a revolução de 1930, os partidos políticos são todos dissolvidos, dando inicio à nova república, liderada pela Frente Liberal.